Paula Pedreira, de Natal (RN), pergunta: Quais são os Santos Mártires do Rio Grande do Norte?
Paula,
Foram cerca de trinta vítimas de dois massacres no interior da capitania do Rio Grande — cujo território daria origem à província do Rio Grande do Norte e posteriormente ao estado do Rio Grande do Norte.
Vinte e cinco homens e cinco mulheres foram reconhecidas como vitimas em dois morticínios diferentes, ambos tendo ocorrido no ano de 1645, durante as invasões holandesas no Brasil. O primeiro massacre ocorreu em julho, na Capela de Nossa Senhora das Candeias, no engenho de Cunhaú, município de Canguaretama. O segundo ocorreu em outubro, na comunidade de Uruaçu, município de São Gonçalo do Amarante.
Beatificação e canonização
Foram beatificados pelo Papa João Paulo II em 5 de março de 2000. No dia 23 de março de 2017, o Papa Francisco autorizou a canonização dos trinta mártires do Rio Grande do Norte. A cerimônia ocorreu em 15 de outubro de 2017, na Praça de São Pedro, no Vaticano, sendo presidida pelo mesmo Papa. Eles são lembrados como protomártires brasileiros, título dado pela Igreja Católica aos primeiros mártires de determinada nação ou localidade.
Massacre de Cunhaú
O primeiro engenho construído na capitania do Rio Grande foi palco de uma disputa territorial e religiosa envolvendo colonos portugueses, holandeses e nativos (indígenas Janduís), uma das mais trágicas disputas da história do Brasil. No ano de 1645, a capitania era dominada pelos holandeses.
Jacob Rabbi, um judeu alemão que lá chegou por meio de um convite holandês, casou-se com uma indígena e morou junto da tribo dos Janduís, seguindo os costumes dos nativos. Chegou ao engenho em 15 de julho de 1645, mas já era conhecido pelos moradores, pois havia passado por lá anteriormente, sempre escoltado pelas tropas dos índios Tapuias e Janduís.
Nesse dia, veio com mais violência. Além dos Tapuias, trazia alguns potiguares e soldados holandeses.
Era domingo, dia 16 de julho de 1645 e, como de costume, os fiéis reuniram-se para celebrar a Eucaristia. Foram à missa na igreja de Nossa Senhora das Candeias, mas Jacob Rabbi havia fixado um edital na porta da igreja: após a missa, haveria ordens do governo holandês. O pároco, padre André de Soveral, responsável pela evangelização na região, começa a celebração e, depois do momento da consagração, as portas da capela foram fechadas: deu-se início ao ataque pelos nativos e invasores holandeses aos colonos leigos e clérigos que celebravam a missa. Ao verem que seriam mortos pelas tropas, os colonos pediram misericórdia a Jesus "entre mortais ânsias, confessaram-se ao sumo sacerdote pelo perdão por suas culpas", enquanto o padre André estava tendo o seu coração arrancado brutalmente do peito pelo jaguar da floresta".
Martírio de Uruaçu
Em 3 de outubro de 1645, três meses depois do massacre de Cunhaú, aconteceu outro, desta vez na comunidade de Uruaçu, este também a mando de Jacob Rabbi.
Logo após o primeiro massacre, o medo se espalhou por aquela e por outras capitanias. A população ficou receosa, pois tinha medo de novos ataques.
No massacre de 3 de outubro, foram cenas idênticas, no entanto com mais crueldade.
Depois da Eucaristia, fecharam as portas da igreja e os mataram ferozmente, arrancaram suas línguas para não proferirem orações católicas, braços e pernas foram decepados, crianças foram partidas ao meio, e grande parte dos corpos foi degolada.
O celebrante, padre Ambrósio Francisco Ferro, pároco da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, mesmo vivo, foi muito torturado.
O camponês Mateus Moreira, sacristão da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, mesmo arrancado seu coração, exclamou: "Louvado seja o Santíssimo Sacramento", e por esse motivo, ele é patrono dos ministros extraordinários da comunhão no Brasil.
Beatificação
Aqui, no Brasil, não foram poucas as dificuldades de implantação do Evangelho. A presença da Igreja foi se afirmando lentamente mediante a ação missionária de várias ordens e congregações religiosas e de sacerdotes do clero diocesano.
Os mártires, beatificados, saíram, no fim do século XVII, das comunidades de Cunhaú e Uruaçu, do Rio Grande do Norte. André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro – presbíteros e 28 companheiros leigos pertencem a esta geração de mártires que regou o solo pátrio, tornando-o fértil para a geração de novos cristãos. Eles são as primícias do trabalho missionário, os protomártires do Brasil. Um deles, Mateus Moreira, estando ainda vivo, foi-lhe arrancado o coração das costas, mas ele ainda teve forças para proclamar a sua fé na Eucaristia, dizendo: "Louvado seja o Santíssimo Sacramento ”.
Capela dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu, em São Gonçalo do Amarante
Os mártires são lembrados em duas datas, no dia 16 de julho, em Canguaretama, e dia 3 de outubro, em São Gonçalo do Amarante. Esta última data é lembrada em caráter estadual: pela lei Nº 8.913/2006, que declara a data feriado estadual.
São lugares de romarias e peregrinações: a Capela dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu em São Gonçalo do Amarante; o Santuário dos Mártires, no bairro Nossa Senhora de Nazaré em Natal e a capela de Nossa Senhora das Candeias, no antigo engenho de Cunhaú.
Canonização
Os Santos Mártires foram canonizados pelo Papa Francisco em 15 de outubro de 2017, na Praça São Pedro, Vaticano.
Mártires
Mortos em Cunhaú, em 16 de julho de 1645
Padre André de Soveral
Domingos Carvalho
Mortos em Uruaçu, em 3 de outubro de 1645
Padre Ambrósio Francisco Ferro - 2° pároco da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação - Catedral Antiga
Mateus Moreira - Sacristão da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação - Catedral Antiga
Antônio Vilela e sua filha
José do Porto
Francisco de Bastos
Diogo Pereira
João Lostau de Navarro
Antônio Vilela Cid
Estêvão Machado de Miranda e duas filhas
Vicente de Souza Pereira
Francisco Mendes Pereira
João da Silveira
Simão Correia
Antônio Baracho
João Martins e sete companheiros
Manuel Rodrigues Moura e sua esposa
uma filha de Francisco Dias.
Localização
Este morticínio aconteceu no Engenho de Uruaçu. Hoje chama-se Comunidade Uruaçu na área do município de São Gonçalo do Amarante – a 18 km de Natal, litoral do RN.
Processo de Beatificação
Segundo o Postulador da Causa dos Mártires, Mons. Francisco de Assis Pereira, “a memória dos servos de Deus sacrificados em Cunhaú e Uruaçu, em 1645, permaneceu viva na alma do povo potiguar, que os venera como enclíticos defensores da fé católica”.
O processo de beatificação foi concedido pela Santa Sé, no dia 16 de junho de 1989. Em 21 de dezembro de 1998, o Papa São João Paulo II assinou o Decreto reconhecendo o martírio de 30 brasileiros, sendo dois sacerdotes e 28 leigos.
Monsenhor Assis acompanhou o processo de beatificação junto ao Vaticano, por mais de dez anos, reunindo documentos em pesquisas realizadas em Portugal, Holanda e no Brasil. Deste material resultou o livro Protomártires do Brasil, de sua autoria, lançado no final de 1999.
A Beatificação aconteceu no Vaticano
A celebração de Beatificação aconteceu na Praça de São Pedro, no Vaticano, dia 5 de março de 2000, presidida por São João Paulo II. Cerca de mil brasileiros participaram da celebração.
Durante a Santa Missa, São João Paulo II pronunciou sua homilia em italiano, português, polonês, francês e inglês. O Papa fez a seguinte reflexão em português:
“São estes os sentimentos que invadem nossos corações, ao evocar a significativa lembrança da celebração dos quinhentos anos da evangelização no Brasil, que acontece este ano.
Naquele imenso País, não foram poucas as dificuldades de implantação do Evangelho. A presença da igreja foi se afirmando lentamente mediante a ação missionária de várias ordens e congregações religiosas e de sacerdotes do clero diocesano. Os mártires, que hoje são beatificados, saíram, no fim do século XVII, das comunidades de Cunhaú e Uruaçu, do Rio Grande do Norte. André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro – presbíteros, e 28 companheiros leigos pertencem a esta geração de mártires que regou o solo pátrio, tornando-o fértil para a geração de novos cristãos. Eles são as primícias do trabalho missionário, os protomártires do Brasil. Um deles, Mateus Moreira, estando ainda vivo, foi-lhe arrancado o coração das costas, mas ele ainda teve forças para proclamar a sua fé na Eucaristia, dizendo: ‘Louvado seja o Santíssimo Sacramento’."
Monumento lembra os Protomártires
Em Uruaçu, local onde outros mártires tiveram suas vidas barbaramente ceifadas, no município de São Gonçalo do Amarante (RN), foi construído um monumento para grandes celebrações e romarias, em parceria com o Governo do Estado.
A inauguração ocorreu aos 02 de dezembro de 2000, com a presença do Governador do Estado, Garibaldi Alves Filho; do Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugênio Sales; do Arcebispo de Natal, Dom Heitor de Araújo Sales; bispos do Regional Nordeste 2; padres e cerca de 12 mil fiéis.
Livros publicados sobre o tema
Ao longo de mais de 363 anos que separam a data do morticínio de Cunhaú e Uruaçu e o atual momento histórico do Brasil, historiadores, jornalistas e escritores têm feito referências ao acontecimento.
Nos últimos anos, porém, três livros merecem destaque pela profundidade com que tratam o assunto:
Protomártires do Brasil, do Postulador da Causa dos Mártires junto ao Vaticano, Monsenhor Francisco de Assis Pereira;
Terras de Mártires, da jornalista Auricéia Antunes de Lima, e
Mártires de Cunhaú e Uruaçu, do Padre Eymard L’E. Monteiro.